terça-feira, 31 de agosto de 2010

eles pensaram nas cortinas de flores

e esconderam a vida real

as casas meio tortas

os homens sem trabalho

as mulheres e seus chinelos

as crianças pelas ruas

é bonito ver o arco-íris passando pela janela do carro

os olhos gostam

mas não se contentam

procuram as frestas

por onde a realidade sai espremida

Dulce

domingo, 29 de agosto de 2010

cabem em mim os que passam
ao lado
ao largo
atentos
ao contrário...
sempre estarão
por dentro
saindo aos poucos
fugindo pelas frestas
ou quando a porta abre de repente
viram personagens
assumem o discurso
fingem outras vidas
e também eu
finjo não reconhecê-los
apresento-me
e eles acanhados
mudam a voz
a cor do cabelo
tossem nervosos
e estrategicamente
deixo-os a vontade

dulce
Gosto das histórias
e de quem as conta de boca cheia
aos pedacinhos
costura cuidadosa
bordados
arremates de fantasia
A vida assim se enche de graça!
antes um percurso
de idas
voltas
de paradas obrigatórias
ou total liberdade para seguir
que a permanência
consciente
no irrealizado
como saber o que vem depois
de que modo condenar o destino
sendo o último caminheiro da trilha
voltando
apagando pegadas
deixando a história perder-se
por conta do desejo de não ser mais?
talvez nada disso seja suficiente
para julgar a vida culpada
dulce

quarta-feira, 11 de agosto de 2010


Um dia as rolinhas que se hospedaram na varanda partiram

não de repente como se espera

mas anunciando a ida

A mãe cuidadosa preparou seus pequenos

deu-lhes a força necessária

a firmeza da confiança

do inevitável

Nada seria diferente

nunca

Sabia do dia em que eles se soltariam

voariam com suas asas

que estavam cumprindo o seu papel

natural

Nenhum sofrimento

apenas o ritual

da separação

para a continuidade

A mãe e os pequenos

tranquilamente viveram

o primeiro voo

dos muitos outros por vir

Nesse dia vi asas nas meninas

e entendi tudo

Dulce




sexta-feira, 6 de agosto de 2010

Contornava com muito cuidado
as voltas do corpo oferecido
nudez clara
comovente
de relevo delicado
calmo
imóvel
lugar estudado de longe
nas noites inquietas de desejo
Estava ali
a certeza de um amor
que traçou caminhos imaginários
desenhou mapas precisos
escapou de encontros reais
Pela primeira vez
não inventava histórias
nem ocupava o silêncio com palavras moldadas a cera
O toque dos dedos
e o arrepio da pele
teciam o seu melhor texto

Dulce