sábado, 12 de julho de 2014

se soubesse da vida
de seus sinais
da ferocidade e doçura do tempo
não deixaria o dia correr com a pressa das conclusões
chegaria antes das marcas
as mudanças estariam na pauta
e talvez fosse mais fácil a escolha
e menos penosa a partida
mas se soubesse mesmo da vida
não provaria o gozo do prazer inesperado
a velocidade das batidas do coração
o arrepio o susto
aquele poema que interrompe o curso do sonho e joga você sem dó na [realidade
a música que resgata do trânsito parado
o gosto da fruta roubada do lado de lá da cerca
queimar o pé na areia quente
as escolhas do filho
e o beijo com gosto de sobremesa
o cheiro da dama-da-noite da casa da vizinha
as notícias de outra guerra
o arrepio que dá ao roçar na pele do braço ao seu lado
a escolha mal feita
e a roupa que sujou no caminho
o amor que liga pra falar do frio e da vontade de estar com você
o palavrão sem querer
a cerveja fora da geladeira
e o bolo que a mãe deixou você encontrar na cozinha de madrugada
o casamento com dias contados
o amor dos dezoito anos de volta
o salário que não saiu
o almoço com o amigo no meio da semana
a última página do livro
e a torcida pra ela abrir a porta do carro e ir embora dali naquela cena [do filme
se soubesse da vida nem valeria a pena
de longe se veria o risco
e perderia a graça

Dulce Moura


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